segunda-feira, 6 de junho de 2011

Interfaces digitais para a organização e representaão do conhecimento.

Anerides Monteiro

Vivemos em um mundo de constantes mudanças, principalmente do ponto de vista da aprendizagem. Há um número representativo de pessoas que tem dificuldades em aprender o mínimo necessário exigido para sobreviver nos dias atuais, pois há uma avalanche de informações; o que necessariamente não significa dizer uma avalanche de conhecimentos.

Pode-se afirmar que nunca as pessoas de uma sociedade foram tão bombardeadas com tantas informações simultaneamente. Este momento social pode ser denominado de “sociedade da aprendizagem”, uma sociedade onde “aprender constitui não apenas uma exigência social crescente – que conduz ao seguinte paradoxo: cada vez se aprende mais e cada vez se fracassa mais na tentativa de aprender” (POZO, 2004).

O referido autor afirma ainda que “essas demandas crescentes da aprendizagem produzem-se no contexto de uma suposta sociedade do conhecimento, que não apenas exige que mais pessoas aprendam cada vez mais, mas que aprendam de outra maneira, no âmbito de uma nova cultura da aprendizagem, de uma nova forma de conceber e gerir o conhecimento, seja na perspectiva cognitiva ou social” (POZO, 2004).

Sendo assim e transportando esta reflexão para o interior das instituições escolares temos que nos reportar-nos à possibilidade do uso das tecnologias como formas alternativas de aquisição de conhecimentos, e que essas tecnologias impliquem “formas específicas e identificáveis de mudança social, econômica e cultural, ou seja a assunção da tecnologia como elemento integrante e essencial na organização social e da nossa experiência subjetiva.” (DAMASIO, 2007, p. 67).

Diante dessas perspectivas e expectativas que apontam imediatas necessidades de direcionar a escola e as aulas a novas possibilidades de aquisição e construção de conhecimento, é que a escola, a sala de aula, os professores e a educação formal não devem se acomodar ou permanecer estagnada.

Como afirma Gadotti (2000) na sociedade do conhecimento é preciso múltiplas oportunidades de aprendizagens, portanto, cabe à escola

amar o conhecimento como espaço de realização humana, de alegria e de contentamento cultural; cabe-lhe selecionar e rever criticamente a informação, formular hipóteses, ser criativa e inventiva, ser provocadora de mensagens e não pura receptora, produzir, construir e reconstruir o conhecimento elaborado.” (GADOTTI, 2000, p. 251)

Assim, a escola passa a ser um espaço onde se gesta conhecimento e não apenas o transmite.

Uma breve reflexão sobre a escola e as exigências atuais, leva a afirmar que cabe à escola munir seus alunos com habilidades e competências exigidas em tal momento social, nesse caso

a sociedade do conhecimento traduz-se por redes, ‘teias’ (Illich), árvores do conhecimento, sem hierarquias, em unidades dinâmicas e criativas, em conectividade, intercâmbio, consulta entre instituições e pessoas, articulando contatos e vínculos.(GADOTTI, 2000, p.251)

Segundo Martínez (2005), atualmente, um dos desafios postos às escolas dos países em desenvolvimento é responder à demanda de acesso universal a educação, além de ofertar uma educação que se preocupe com a diversidade cultural, com o desenvolvimento das comunidades que com o passar dos tempos vem adquirindo papéis bem mais ativos nas decisões, principalmente educativas.

Tais afirmativas remetem-nos a pensar no uso da Internet, em ferramentas cognitivas, em Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC), em redes de comunicações, em novos espaços de ensino-aprendizagem, em inéditos desafios para criar e partilhar conhecimento.

Novas formas de ensinar e aprender, estes são os grandes desafios da educação para atender ás atuais demandas sociais.

Partir do pressuposto que os alunos conhecem e utilizam os computadores e ambientes virtuais, é uma premissa favorável para a utilização dos mesmos em sala de aula.

O uso do computador como apoio á aprendizagem deve ser significativo para que se torne uma ferramenta cognitiva ou como afirma Jonassen (2007) as aplicações pedagógicas da informática são feitas com a exigência que os alunos pensem de forma significativa a fim de utilizarem tal recurso como representação de sua capacidade de produzir conhecimento e não apenas reproduzi-los e assim há necessidade do envolvimento cognitivo dos alunos, e essa é uma possibilidade de melhorar qualitativamente seu desempenho.

Inúmeras são as possibilidades de uso, mas atualmente muitos educadores usam os fotologs, videologs, weblogs pois eles “são aplicativos fáceis de usar que promovem o exercício da expressão criadora, do diálogo entre textos, da colaboração”, afirma a educadora Suzana Gutierrez, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; ela ainda reforça que “os blogs possuem historicidade, preservam a construção e não apenas o produto (arquivos); são publicações dinâmicas que favorecem a formação de redes”; além dos weblogs que “abrem espaço para a consolidação de novos papéis para alunos e professores no processo ensino-aprendizagem, com uma atuação menos diretiva destes e mais participantes de todos” (GUTIERREZ, 2007)

Os blogs, fóruns, chats, PodCasts por exemplo, podem ser usados de infinitas formas como recursos educacionais para criar textos, relatórios de visitas, publicarem fotos e vídeos produzidos pelos alunos, conseqüentemente eles passam a participar de seu processo educativo e de construção de conhecimento e deixam de ser meros expectadores-passivos.

Moran (2007) afirma que existem diversas possibilidades de utilização dos blogs na escola, quer pela facilidade de sua publicação, que não exigirá conhecimentos específicos de tecnologia de seus usuários; quer pelo fascínio que estes recursos exercem sobre os alunos. No entanto, aos professores, cabe a tarefa de se adequarem ao mundo virtual de seus alunos e não ficar alheios a este contexto.
Outro recurso interessante a ser usado através da Internet para desenvolvimento de pesquisa em grupos é o webquest.

Moran (2007) relata que a webquest pode ser usada em uma atividade de investigação e pesquisa onde os alunos interagem com as informações organizadas, geralmente elaborada pelo professor, para ser solucionada pelos alunos, em grupos. Esta atividade “propicia a socialização da informação: por estar disponível na Internet, pode ser utilizada, compartilhada e até reelaborada por alunos e professores de diferentes partes do mundo. O problema da pesquisa não está na Internet, mas na importância que a escola dá ao conteúdo programático do que à pesquisa como eixo fundamental da aprendizagem.”

O importante é saber em que os computadores, as ferramentas disponíveis, as novas tecnologias, a Internet, por exemplo, podem contribuir para a melhoria da qualidade das aulas e do ensino-aprendizagem, além de favorecer o construcionismo (PAPERT apud Damásio, 2007, p.125).

A teoria construcionista pode ser entendida como “na forma como o conhecimento é construído e transformado quando é expresso através de diferentes media”. Para Papert2 “a chave do ensino reside na projecção individual de idéias através da expressão dessas mesmas idéias em ordem à criação de mecanismos de comunicação com os outros”. (DAMÁSIO, 2007, pg. 125)

Neste caso, os sujeitos se desenvolvem através de expressões individuais que encontram nas tecnologias computacionais o principio do processo individual de criação de expressões cognitivas.

KENSKI (p. 47) afirma que em relação à educação, “as redes de comunicação trazem novas e diferenciadas possibilidades para que as pessoas possam se relacionar com os conhecimentos e aprender”. Novas formas de ensinar e aprender, estes são os grandes desafios da educação para atender às atuais demandas sociais.


Referências Bibliográficas

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DAMASIO, Manuel José. Tecnologias e Educação: As tecnologias da Informação e da Comunicação e o processo Educativo. Lisboa. PT: Ed. Vega, 2007

GADOTTI, Moacir (Org.) Perspectivas atuais da educação. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000

GUTIERRE, Priscila Brossi. Blogs na sala de aula: Cresce o uso pedagógico da ferramenta para publicação de textos na Internet.
Disponível em http://www.educarede.org.br/educa/revista_educarede/especiais (acesso 19.dez.2007)

KENSKI, Vani Moreira. Educação e Tecnologias: o novo ritmo da informação. Campinas: Papirus, 2007.

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MORAN, José Manuel. Como utilizar as tecnologias na escola. Disponível em http://www.eca.usp.br/prof/moran/utilizar.htm, acesso em 10.mai.2007

POZO, Juan Ignácio. “A sociedade da aprendizagem e o desafio de converter informação em conhecimento”. Disponível em http://www.bookman.com.br/patio.htm.. acesso em 16.mai.2007

Formação de Professores: um grande desafio.

Desafios da escola: uma conversa com os professores
PGM 2 – O PROFESSOR E SUA FORMAÇÃO
Maria Umbelina Caiafa Salgado

Introdução

Segundo a Lei de Diretrizes e Bases – LDB de 1996, o professor é um profissional da educação, que deve ter plano de carreira, acesso à formação inicial e continuada e condições adequadas de trabalho. Essas determinações de fato correspondem às demandas do pessoal docente, mas estão longe de ser uma realidade efetiva, neste momento. Não existem dados sistematizados sobre a formação continuada, nem sobre os estados que já criaram e implantaram seus planos de carreira e a avaliação de desempenho. O piso salarial profissional não passou ainda de um tema de discussão e as condições de trabalho apresentam muitas falhas. Mesmo a situação da formação inicial está muito aquém da desejável, havendo em exercício, na educação básica de todo o país, cerca de 1 milhão e 300 mil professores que não têm formação em nível superior.
No momento, estão sendo discutidas, em nível nacional, várias propostas de políticas destinadas a superar as deficiências no cumprimento das disposições da LDB a respeito do professor. No entanto, não pretendemos analisá-las neste momento. Nossa intenção é refletir sobre o pressuposto geral que fundamenta o Título VI e o Artigo 67 da LDB – o significado da noção do professor como um profissional – e o modo como a formação inicial e continuada pode contribuir para que o professor se perceba como um profissional.
Essa discussão é importante, pois o conceito clássico de profissional encontra-se em crise. Ao defender a idéia do professor como um profissional, não estaríamos embarcando em uma “canoa furada”? Por outro lado, não estaríamos falando em profissionalização quando o que de fato vem ocorrendo é a proletarização do professor (Santos, 1995), que se vê compelido a realizar trabalhos que fogem às suas incumbências, e que não goza de autonomia pedagógica, nem de reconhecimento social? O fato é que a noção de profissional mudou, e temos necessidade de identificar os aspectos em que mudou.

A crise da noção clássica de profissão

A idéia clássica de profissão – cujos exemplos mais usuais são a Medicina, o Direito, a Engenharia, a Farmácia, a Odontologia, entre outras – caracteriza-se pelos seguintes aspectos:
• Conhecimentos profissionais especializados, adquiridos em formação inicial de alto nível, que confere um título e define legalmente um território exclusivo de atuação.
• Formação baseada nas ciências puras e em sua aplicação ao trabalho profissional.
• Autocontrole da prática, autonomia para adaptação a situações novas, e avaliação apenas pelos pares.
• Necessidade de atualização contínua dos conhecimentos profissionais.
• Responsabilidade pelo mau uso dos conhecimentos profissionais, incluindo falta de ética e erros que prejudiquem os clientes.
Analisando essa concepção de profissional, na época presente, Tardif (1991) identifica uma série de problemas, que configuram uma crise em quatro dimensões: a) crise de perícia (a concepção de ciência aplicada, como base da preparação profissional, é posta em cheque pela noção de saberes, cuja racionalidade é limitada); b) crise de formação (a insatisfação com a fragmentação e a alienação do ensino universitário, que se distancia do campo de trabalho profissional); c) crise de poder (a intermediação da ação profissional por sistemas burocráticos que limitam sua autonomia – como, por exemplo, os planos de saúde em relação ao médico) e d) crise de Ética (as implicações de ter seres humanos e o meio ambiente como finalidades da ação profissional).
Essa análise se reforça por um fenômeno que podemos facilmente perceber à nossa volta: a reconfiguração geral dos campos profissionais, com o surgimento ou reconhecimento de novas profissões e o desaparecimento ou transformação de outras. Para isso, basta analisar as novas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), que propõem, por exemplo, a formação do Médico como membro de uma equipe de saúde, em que se integram, além da Enfermagem, a Fisioterapia, a Fonoaudiologia, a Terapia Ocupacional, a Nutrição, a Biomedicina etc. Por outro lado, estão sendo elaboradas DCN para atividades que não eram consideradas profissões, no sentido clássico, como por exemplo: Design, Hotelaria, Dança, Secretariado Executivo, Turismo etc.
Nesse contexto, cabe perguntar: que profissional é o professor? Como formá-lo?
A Epistemologia da Prática
Para Tardif, é necessário que, nos tempos atuais, a formação profissional se baseie em uma nova epistemologia: a “epistemologia da prática”, que ele define como “o estudo do conjunto de saberes utilizados realmente pelos profissionais [professores, no caso], em seu espaço de trabalho cotidiano, para o desempenho de todas as suas tarefas (Tardif, 1991). Assim, a formação do professor, de acordo com a “epistemologia da prática, contribuiria para dar novo significado também à escola e à profissão docente (Nóvoa, 1991).
A idéia de uma “epistemologia da prática” resulta de transformações na ciência contemporânea relacionadas ao desenvolvimento da microfísica (Santos, 1997) e ao pensamento de autores como Kuhn (1962), Foucault (1971) e Canguillen (apud Machado, 1981), que criam novos objetos epistemológicos – como o cotidiano, os jogos de linguagem e a prática, entre outros – e demonstram a historicidade do conhecimento (Tardif, 1991). Assim, a prática passa de campo de aplicação a campo de produção do conhecimento, conferindo-se legitimidade aos saberes práticos.
Nesse contexto, torna-se necessário admitir que a formação inicial, por mais indispensável que seja e por melhor qualidade que tenha, é intrinsecamente inacabada e que os primeiros anos de exercício profissional envolvem importantes novas aprendizagens, que vão além da simples aplicação do que foi estudado na Universidade. Vê-se, pois, que as concepções de atualização e reciclagem não se confundem com a de formação continuada: embora esta possa valer-se também daquelas, tem uma dimensão relacionada à complementação da formação inicial e à reelaboração teórico-crítica da prática cotidiana, ao longo de toda a carreira profissional.
Além disso, a epistemologia da prática, considerando a vida cotidiana como objeto de conhecimento, aborda a integração das dimensões pessoal e profissional. Como disse Nias (1991, apud Nóvoa, 2000), “o professor é a pessoa; e uma parte importante da pessoa é o professor”. Essa orientação deu origem a estudos de caráter holista (Huberman, 2000; Goodson, 2000; Perrenoud, 2001) que identificam, no profissional, as dimensões do saber, do fazer, do ser e do conviver.
O processo identitário do professor
Na perspectiva da epistemologia da prática, antes de pensar na formação do professor, é necessário refletir sobre sua identidade. O que significa identidade? Segundo a Antropologia, a identidade tem simultaneamente uma dimensão individual e uma dimensão coletiva. No plano individual, nossa identidade corresponde ao que pensamos que somos, às idéias e representações que desenvolvemos sobre nós mesmos. No plano coletivo, indica os papéis que desempenhamos em cada grupo social ao qual pertencemos: somos brasileiros ou não, homens ou mulheres, pais ou mães, filhos ou filhas, pertencemos a essas ou àquelas associações sociais ou profissionais etc. Os modos como vivemos nossos papéis nos diferentes grupos se influenciam mutuamente, de forma que nossa identidade se constitui pela interação das especificidades desses grupos aos quais pertencemos. Isso significa que ela possui variadas dimensões, que se articulam e mudam no tempo: na verdade, não temos uma identidade, mas sim identidades.
Focalizando apenas o Brasil, percebemos facilmente que a identidade do professor mudou, passando das figuras da normalista cheia de ideal ou do educador que trabalha por vocação, como se fosse um “sacerdote”, para as do técnico em ensino e do trabalhador da educação. No momento presente coloca-se a noção do professor profissional da educação que, ao formar-se, forma também a escola e produz a profissão docente (Nóvoa, 1991). De que modo, no entanto, se dá essa dinâmica do processo identitário do professor, ao longo de sua formação inicial e continuada?
Considerando a importância das interações sociais e do contexto político e social para a formação do professor, podemos dizer que é importante prever tempos e espaços curriculares, tanto na formação inicial quanto na continuada, para que ele – profissional em formação – possa refletir criticamente sobre diferentes aspectos de sua prática pedagógica, em que seu trabalho “dialoga” com diversos interlocutores: a própria sociedade (famílias dos alunos), o sistema de ensino (MEC, Secretarias de Educação), a categoria docente (cujo campo de trabalho é a escola), a instituição escolar (em que vivencia relações hierárquicas vinculadas aos papéis institucionais), a escola em funcionamento (em cuja organização trabalha com seus pares ) e a sala de aula (em que interage com os alunos). Esse conjunto de relações, que se mesclam e se conformam mutuamente, resultam na dinâmica do processo de formação da identidade do professor como um profissional.
Com base na abordagem sintetizada nos parágrafos precedentes e nas responsabilidades hoje atribuídas ao profissional da educação, podemos distinguir em sua identidade três dimensões inseparáveis, pois ele é, simultaneamente: a) um especialista que domina um instrumental próprio de trabalho e sabe fazer uso dele; b) um pensador capaz de repensar criticamente sua prática e as representações sociais sobre seu campo de atuação; c) um cidadão que faz parte de uma sociedade e de uma comunidade.
Como especialista, é necessário que o docente:
• conheça os conteúdos curriculares do Ensino Fundamental, compreenda seu modo de produção, seus princípios, desdobramentos e implicações, de forma a conseguir uma adequada transposição didática dos conhecimentos para a situação escolar;
• saiba como articular diferentes conteúdos, tratando o conhecimento de forma interdisciplinar e adequando-o às experiências culturais e às condições de aprendizagem dos alunos;
• domine seu instrumental de trabalho, de modo a ser capaz de planejar, desenvolver e avaliar situações contextualizadas de ensino e aprendizagem, e outras atividades pedagógicas, nos anos iniciais do Ensino Fundamental;
• saiba valer-se das novas tecnologias da comunicação e da informação, incluindo a Informática;
• saiba interagir com as famílias dos alunos e com a comunidade em que se situa a escola;
• desenvolva uma mentalidade aberta às mudanças, que o leve a ser inovador em suas ações e no trato com os currículos e as situações de ensino e aprendizagem.
Como pensador, é essencial que o professor:
• compreenda a natureza da educação e da escola em suas diferentes dimensões – local, regional, nacional e mundial;
• conheça as experiências culturais de seus alunos e saiba situá-las no quadro da aprendizagem e do desenvolvimento humano;
• seja capaz de produzir saberes pedagógicos e de contextualizar sua própria prática, relacionando-a de forma crítica aos alunos, à comunidade e à sociedade;
• saiba administrar sua própria formação;
• compreenda a cultura contemporânea e possa fruir dela em suas diversas manifestações: literatura, cinema, teatro, televisão, artes plásticas etc.;
• desenvolva sua capacidade crítica em função da evolução da sociedade globalizada.
Como cidadão, é fundamental que o professor:
• participe da dinâmica social, percebendo-se como pessoa que tem direitos e deveres comuns a todos e, ao mesmo tempo, como um profissional que tem um campo de atuação, um instrumental de trabalho e um ethos específicos;
• comprometa-se com a democratização e a qualidade da educação escolar disponibilizada para todos;
• atue, efetivamente, em favor da construção de uma sociedade mais justa, mais democrática, mais livre, sem exclusão.
Formação e identidade profissional do professor
Essas reflexões nos apontam algumas orientações para a elaboração de uma proposta curricular adequada à formação do professor dos anos iniciais do Ensino Fundamental, e que podem ser resumidas da seguinte forma:
A educação é um processo antropológico, que começa antes e se prolonga além da escola. Esta instituição partilha com outras entidades a responsabilidade de orientar o desenvolvimento da infância e da juventude, mas tem a função específica de fazer mediação entre o projeto educacional da sociedade como um todo e as aspirações, expectativas e necessidades dos alunos individuais. Assim, o professor tem de ser formado para ser sobretudo um mediador, processo altamente complexo em uma sociedade marcada pela desigualdade social como a nossa.
As experiências prévias, quer pessoais, quer profissionais, do formando devem ser consideradas e valorizadas, num quadro de inclusão e de multiculturalidade. Um currículo atual para a formação de professores deve conter oportunidades de enriquecimento, fruição e ampliação cultural dos cursistas.
A escola é o locus por excelência da formação continuada e deve ser um espaço importante, na formação inicial. É essencial que universidades ou institutos de formação de professores estabeleçam parcerias com escolas da rede de educação básica, assegurando espaço de prática pedagógica para seus alunos e, como contrapartida, oferecendo serviços especializados, para colaborar com a formação continuada dos docentes das instituições parceiras. No caso da formação inicial em serviço – tão freqüente no momento atual –, o que à primeira vista pareceria uma limitação, passa a ser uma vantagem: estudando e trabalhando ao mesmo tempo, o professor tem mais oportunidades de receber orientação e acompanhamento da prática e, sobretudo, tem um material mais rico para completar o ciclo da ação - reflexão - ação.
A aprendizagem é um processo interativo, ao mesmo tempo individualizador e socializador, e a formação deve prever tempos e espaços curriculares para a interação e o trabalho coletivo. Em uma linha que não é estranha ao pensamento de Paulo Freire, fica subtendido que os professores não poderão ser tratados como receptores passivos, mas sim como pessoas com capacidade crítica, cuja experiência será considerada um valor acrescentado ao processo de formação, e que deverá servir como ponto de partida, para aprimorar sua ação profissional e estimular sua participação no processo de melhoria da sociedade.
A atual concepção de conhecimento – em que a metáfora da árvore é substituída pela metáfora da rede, relativizando a importância dos pré-requisitos e traçando múltiplos percursos alternativos de aprendizagem – implica não uma interdisciplinaridade “natural” ou automática, mas a construção dela, em função do profissional que se deseja formar, sendo necessário, neste caso também, prever tempos e espaços curriculares adequados para o trabalho interdisciplinar.
Nesse contexto, a avaliação é concebida como etapa do processo de ensino e aprendizagem, compreendendo um momento diagnóstico inicial, um percurso de acompanhamento formativo e um momento de balanço, que conclui uma etapa e, simultaneamente, dá início à seguinte.
Ainda considerando a concepção atual de conhecimento, o currículo deve permitir a ação em espiral, retomando e aprofundando os conteúdos e as práticas, em diferentes momentos. Assim, os alunos poderão ter várias oportunidades de recuperação e, até o final do curso, o tempo será válido para o cumprimento dos requisitos vinculados ao perfil de profissional buscado e, portanto, necessários para a certificação do professor.
Na formação do professor, a ação educativa não pode ser fragmentada em atos isolados. Deve, sim, constituir um processo contínuo de ação – reflexão - ação, no qual a prática não se dissocia da teoria, desde o primeiro momento do curso.
A antiga noção de prática de ensino dá lugar à concepção de prática pedagógica, mais ampla, que articula a ação docente na sala de aula, na escola, na profissão, no sistema de ensino e na sociedade.
Conclusão
As reflexões desenvolvidas nos tópicos precedentes nos mostram que a idéia de um professor profissional só faz sentido no contexto de um conjunto de medidas destinadas a tornar reais as determinações da LDB. Neste texto, porém, nós nos concentramos na formação do professor e vimos como ela pode contribuir para torná-lo um novo profissional, que produz a si próprio na perspectiva da epistemologia da prática. Isso significa que, se a formação inicial garante o tratamento sistemático dos conhecimentos do professor – como especialista, como pensador e como cidadão –, os saberes que produz em seu cotidiano dão-lhe a segurança e a serenidade para o trato com os alunos. Nessa perspectiva, a formação continuada não apenas se reporta à atualização do professor, mas principalmente permite o distanciamento crítico, necessário para uma reflexão mais aprofundada, que analise e consolide os saberes da prática, evitando que se transformem em simples senso comum.
Bibliografia
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Fonte: Salto para o Futuro